CHEGOU!!! CRÔNICAS & RABISCOS, em março, grande lançamento! Crônicas de humor, edição ilustrada

sexta-feira, 28 de maio de 2010

ONOFRE, o novato no campo


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Grávido

(Óscar Fuchs)

Se pudesse escolher alguma mudança em mim, hoje, queria poder engravidar. Eu sei que a população cresce em escala geométrica, enquanto a produção de alimentos cresce em escala aritmética, ou vice-versa, porque sou uma nulidade em matemática e nunca consegui decorar essa Lei de Malthus. Também sei que escola não é barata, que consulta médica não é barata, que fralda não é barata, que a única coisa realmente barata que existe é um inseto de seis pernas... ou serão oito? Enfim, sei de todas as dificuldades de uma gravidez, das dificuldades de um parto e nem quero imaginar o momento da concepção. Já as diferenças fisiológicas e psicológicas entre uma mulher e eu, nem se discute.


Sei, ou percebo, que a mulher deseja a gravidez por um certo instinto ancestral, acentuado pelo modo de criação e pela imposição social desde a infância, quando é induzida a brincar de boneca, de casinha e, algumas vezes, de médico.

Como homem nunca tive esse instinto da procriação. O modo de criação dos meninos era diametralmente inverso ao das meninas, e ainda é, afastando ao máximo das brincadeiras femininas. Jogava futebol para acentuar meu caráter guerreiro, matava passarinho e pescava para firmar minha índole de provedor e brincava de médico com as meninas só por sacanagem mesmo.

Fisiologicamente, já estou sabendo de pesquisas demonstrando que a vida sempre encontra um espaço livre dentro do corpo onde possa se desenvolver. Um espaçozinho qualquer que não esteja sendo utilizado para nada e que poderia ser ocupado pelo feto. Meu crânio, por exemplo, que abriga um cérebro sedentário e reduzido poderia ser uma alternativa. Vamos e venhamos (pago a ida, você paga a volta), eu ficaria ridículo andando por aí com uma cabeça grávida.

Ainda haveria uma terceira dificuldade: a escolha do parceiro. Imagine eu andando por aí tentando identificar um macho forte, de boa cepa, que me garantiria uma cria saudável. Para isso, hoje, existe a inseminação artificial. Dupla inseminação, já que teria que plantar também um óvulo.

Portanto, engravidar é um desejo impossível. O que é uma pena, porque me exclui da chance de fisgar um jogador de futebol, conquistar a fama e uma polpuda pensão mensal. Ou de ter um affair com algum astro do rock e ver meu currículo enriquecido pela repentina capacitação: apresentador de programa de televisão. Ou engravidar de um senador da república, receber um cachê astronômico de uma revista e, talvez, ser rainha de bateria de uma escola de samba.

Mas eu não desisto. Há outras possibilidades de vender-se sem precisar ter talento ou inteligência. Uma delas é uma bunda grande, atraente e rotunda. Já estou fazendo musculação nos glúteos e pesquisando procedimentos para um implante de silicone. Se tudo der certo, em breve me verão num grupo de pagode ou funk. Me rebolando todo.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

ONOFRE, o novato no campo

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Um Livro Cansativo

(Óscar Fuchs)

Finalmente acabei a leitura de um dos livros mais cansativos que tive nas mãos. Há alguns anos o historiador J. M. Roberts se pôs obstinadamente a escrever a história do mundo. Toda a história do mundo! E conseguiu. Mas quando, depois do hercúleo trabalho, levou os originais a seu editor soube que aquele calhamaço não poderia ser editado em um único volume, mas no mínimo em oito, o que seria impossível por razões comerciais. Assim, o editor pediu que a obra, toda aquela pesquisa e dedicação, fosse reduzida a apenas um volume. Não conheço Roberts pessoalmente, mas parece ser uma pessoa bem humorada pelo título que escolheu para o livro compactado: The shorter history of the world ou, em bom português, A mais curta história do mundo. Certamente uma ironia para alfinetar o editor, que ferira seu orgulho “por razões comerciais”.

No Brasil The shorter history of the world foi publicado com o título de O Livro de Ouro da História do Mundo – da pré-História à Idade Contemporânea (Editora Ediouro). É magnificamente escrito e de deliciosa leitura. Ainda assim é cansativo, não para ler, mas para segurar. Apesar de todo o esforço de Roberts, o livro tem quase mil páginas em tamanho grande, o que o torna um bloco de granito. Lê-lo deitado acarreta um afundamento do plexo. Sustentando nas mãos, uma tendinite ou bursite. Enfim, segurá-lo é um trabalho braçal cansativo que esgota fisicamente. A solução é colocá-lo sobre uma cadeira, estante ou mesa e deliciá-lo sentado, como se faz numa refeição.

Em A mais curta história do mundo — desculpem, mas prefiro o título original traduzido por ser irônico —, Roberts narra desde que a História ainda não era História, até os dias de hoje. “A História é a narrativa dos seres humanos, e o que nos interessa é o passado humano”, diz ele. Portanto, teoricamente, a História deveria começar pelo primeiro ser humano, mas quando surgiu o primeiro humano? Daí vem o termo pré-História, significando “anterior à história”, pois o ser humano ainda não existia. E Roberts optou por contar tudo, desde o início, já que é difícil saber quando ou onde surgimos, apesar das pesquisas e suposições.

Porém, o que mais impressiona, além da qualidade e do peso do livro, é a demonstração de como nós, seres humanos, somos efêmeros, passageiros e instantâneos. “Os primeiros símios e macacos — então os primatas mais desenvolvidos — apareceram há cerca de 25 milhões de anos”, diz o autor. E quando chegamos ao final do livro temos a sensação, ou melhor, a percepção de que aquilo que aconteceu há 100 ou 200 anos, foi agora!

Essa sensação fica clara quando abrimos um dos últimos capítulos, intitulado Época Atual: A Longa Trajetória. Passamos pelos impérios egípcio e fenício, passamos pelo babilônico, persa, macedônico, romano, cartaginês, turco otomano, mongol, chinês, o Sacro Império Romano — que durou cerca de mil anos! —, até chegarmos ao germânico e ao atual americano, só para citar alguns. Todos os impérios levaram centenas de anos para serem consolidados e duraram outras centenas de anos, com exceção do império americano. Nessa comparação nos damos conta de que esse império americano surgiu no curso de apenas algumas décadas e que só existe há cerca de 60 anos. Ou seja, ao contrário do que acontecia na história anterior, na história da nossa geração um império se forma, se consolida e talvez venha a sucumbir no espaço de apenas uma vida!

Hoje a história está mais rápida, tudo é vertiginoso e de uma hora para outra tudo muda. Em nosso dia-a-dia as coisas surgem como novidades e desaparecem logo depois, e isso se reflete na política, na economia e em todas as outras relações, seja entre pessoas, corporações ou entre blocos de nações e potências. Ao terminar a leitura de nossa história, chegamos à conclusão de que provavelmente, se continuarmos nesse ritmo, também não vamos durar muito. A única reparação em A mais curta história do mundo talvez seja o título do capítulo 13. Em vez de Época atual, o historiador J. M. Roberts poderia tê-lo intitulado “A que ponto chegamos!”