CHEGOU!!! CRÔNICAS & RABISCOS, em março, grande lançamento! Crônicas de humor, edição ilustrada

segunda-feira, 20 de maio de 2019

Cultura


quarta-feira, 8 de maio de 2019

Bobinho


Diferente


Páscoa


Ai!


S.T.F.


Galope


Desculpas


segunda-feira, 1 de abril de 2019

Aos dubladores

 A gente sabe que dublagem não é fácil. Ter que combinar os movimentos da boca e todos os outros gestos a uma fala estrangeira requer muita competência. Por isso, talvez, algumas dublagens deixam a desejar.
        Dia desses vi um filme em que o personagem chegava correndo a uma estação do metrô. Ele apontava para o túnel de onde saiam os trilhos e gritava para seu colega:
        ─ Tem um trem! Tem um trem!
        A cena ficou ridícula. O que o personagem esperava que viesse daquele túnel com aqueles trilhos de trem, um camelo?
        No original, a fala seria Take the train! Take the Train! (Pegue o trem! Pegue o trem!), mas o dublador tinha que adequar a fala ao movimento. Ou o roteirista da dublagem não tinha imaginação. De qualquer forma, a estória não era tão boa.
        Há, porém, falhas de dublagem recorrentes e que machucam os ouvidos quase todos os dias. A que optei por denunciar é a da maldita “serra elétrica”. Penso que, na verdade, o erro nem começou com os dubladores e sim com os tituladores de filmes.
        Em “O Massacre da Serra Elétrica” ─ que tanto pode ser classificado como um  filme de terror, ou como um  terror de filme ─ o erro já começa na tradução do título. Pra você que perdeu duas horas de sua vida assistindo a esse filme, pergunto: viu algum fio elétrico saindo da serra? Não, né? E, se houvesse esse fio, como o vilão perseguiria aquele bando de idiotas sem se enrolar? Eu me enrolo todo no fio do aspirador de pó, que só tem três metros!
        Imagina o terrível assassino da serra chegar ao local do massacre e sair andando de lado, ao longo das paredes, com o fio da serra elétrica na mão e procurando:
        ─ Cento e dez... cento e dez... cento e dez... Cadê a tomada duzentos e vinte, pô!
        Ou se, no momento do massacre, a serra só emitisse um puf...puf...puf  e de repente ele percebesse que tinha ligado na tomada errada?
Imagino, então, que os dubladores tenham embarcado na mesma onda dos tituladores, para quem qualquer serra é uma serra elétrica. Desembarquem, dubladores.
        Assisto documentários de desbravadores, daqueles que vivem em lugares remotos, onde é indispensável uma serra. Porém, todas as vezes que dublam ou narram o uso de uma serra, dizem que a serra é elétrica. Não é!
        O lugar é remoto, portanto, não há energia elétrica por perto. A eletricidade mais próxima, se houver, está há dez quilômetros de distância e vem de um gerador. O desbravador está lá no círculo polar ártico, no meio da neve, dentro de uma floresta que tem a extensão de quase todo o Alasca e, quando vai derrubar uma árvore, o dublador coloca em sua boca:
        ─ Preciso ir até meu trenó pegar a serra elétrica.
        E eu pergunto: vai ligar em qual tomada!?
        Naqueles programas em que constroem cabanas no meio do nada acontece o mesmo. De repente alguém grita lá do telhado:
        ─ Ei, Scot! Me alcance a serra elétrica!
        Quantos quilômetros de fio seria preciso para chegar a essa serra elétrica?
        Dubladores, a título de contribuição, explico: o que usam nesses lugares não são serras elétricas, mas motosserras. A motosserra é uma serra com motor a combustão, que funciona com gasolina, como um motor de motocicleta ou de barco. É específica para lugares remotos e isolados, pois só é preciso levar um ou dois galões de combustível para fazê-la trabalhar.
        Até entendo a explicação de que a palavra motosserra não se encaixa nos movimentos labiais do personagem, só que serra elétrica não se encaixa nem nos movimentos labiais, nem na lógica.
      Portanto, lanço uma campanha. Deve haver uma dezena de palavras e expressões que combinem com os movimentos labiais dos personagens e que deem o sentido de motosserra. Quem souber, descobrir ou inventar uma dessas, por favor, contribua: envie para os dubladores!
        Se não corrigirem isso logo, poderá haver um massacre de motosserra. E esse, não ficção.

sexta-feira, 29 de março de 2019

Arminha


segunda-feira, 25 de março de 2019

Figurinha

Óscar Fuchs

O Armando sabia perfeitamente que quando uma mulher diz uma coisa, na verdade quer dizer outra. Se uma mulher diz “Ai, tô horrível hoje!”, ele sabe que ela está dizendo “Me elogia, vai!”. Não é à toa que sempre foi o maior conquistador da turma: sabia perfeitamente o que as garotas queriam dizer e o que queriam ouvir. Ele treinou para isso a vida toda, para interpretar as mulheres. Até o dia em que conheceu a Janete.
Armando já estava naquela idade em que se definia como um “coroa apetitoso” e em que se considerava um intérprete infalível das frases femininas. Janete  tinha a mesma idade e tiveram uma conversa rápida quando se conheceram no lançamento de um livro. Depois de alguns olhares trocados, ele se aproximou sorrindo:
─ Espero que gostemos. ─ Disse, na fila de autógrafos.
Ela virou-se como se não o tivesse notado ali às suas costas, mas ele sabia que fingir surpresa é um dos artifícios femininos.
─ Vou gostar, com certeza. ─ Respondeu Janete ─ Já li os dois anteriores.
Quando ele fingiu-se impressionado e disse que ela parecia uma leitora voraz, ela explicou que estava lendo mais nos últimos tempos. Armando interpretou que ela estava sozinha e passava mais tempo em casa, lendo.
Alguns dias depois, por acaso ou não, tiveram outro encontro casual. Trocaram telefones:
─ Mas não me liga ─ pediu ela ─, manda wats . Correria de trabalho, entende?
Ele entendia, mas sabia que não era isso. Na verdade ela não queria ser pega de surpresa, queria pensar bem antes de responder a ele.
Armando mandou o watts:
─ Que tal um café... um vinho... ou qualquer... outra coisa?
Perfeito, pensou. Convidativo, bem humorado, insinuante e o mais importante: provocativo.  Da resposta poderia tirar várias conclusões, só analisando o que ela escrevesse. Mas ela não escreveu. Em vez disso, mandou uma figurinha. O desenho de uma moça com as mãos espalmadas para cima, com os ombros encolhidos e que tanto poderia significar talvez, como você que sabe ou prá quê?.
Tentou outro wats, mais objetivo, onde perguntava apenas topa? E ela respondeu com a figurinha de uma piscadela. O que significaria essa piscadela? Perguntou-se. Terceira tentativa, outra pergunta e veio outra figurinha: uma carinha de surpresa. Indecifrável, pensou.
Há três meses Armando vem tentando interpretar a Janete, mas só recebe figurinhas dúbias. Está tenso, anda inquieto, ansioso. O que fazer agora? Começar tudo de novo? Anos e anos compilando mentalmente o sentido das respostas femininas, pra nada! A essa altura da vida terei que estudar uma nova linguagem?

E enviou a ela a figurinha mais enigmática que conseguiu encontrar, um pouco por vingança, um pouco por provocação. Quem sabe agora ela manda uma resposta civilizada, pensou.

segunda-feira, 11 de março de 2019

Zodíaco

Não se conheciam, se encontraram, assim, numa noite qualquer, num bar, por acaso:
─ Oi, sou o Gerson.
─ Oi. Sou a Andréa.
─ Quer beber alguma coisa, Andréa?
─ Não sei...
─ Que tal um Martini?
─ Eu tava pensando nisso, mas...
─ Então, que tal uma cerveja?
─ Você vai beber o quê?
─ Cerveja.
─ É, cerveja ia bem.
─ Então, duas cervejas.
─ Mas... acho que vou no Martini, Gerson.
─ Ok, um Martini e uma...
─ Tô indecisa...
─ Ãhã... indecisa...
─ Isso.
─ Entre Martini ou cerveja?
─ É. O que você acha?
─ Olha, acho que... não tem muita importância pra esse momento, entende?
─ Tá, cerveja.
─ Duas cervejas, então.
─ Me diz, Gerson, qual é teu signo?
─ Aquário.
─ Uhm...que legal! Gosto de aquário por que são sempre do contra.
─ Não concordo.
─ Tá vendo?
─ É. Mas tive que discordar.
─ Pois é, qualquer coisa que a gente diga, o aquariano discorda.
─ Discordo.
─ Eu sei. Vocês, aquarianos, não acreditam em nada do que a gente diz.
─ Isso não é verdade.
─ Tá vendo?
─ Tá bem... acontece que tudo o que vocês dizem sobre os aquarianos, nem sempre é verdade.
─ Eu disse uma verdade agora. E a sua resposta foi uma prova.
─ Que prova? Isso não é uma prova, é uma suposição!
─ Razão e suposição. Vocês sempre acham que estão com a razão.
─ Peraí. Até agora você só falou “eu acho”, “talvez”, “suponho”, “às vezes”...
─ E daí?
─ “E daí” que você não é definitiva em nada!
─ Como assim?
─ Você não é objetiva, direta, assertiva, específica!
─ Acho que sou.
─ Tá vendo? Até nisso, você “acha”.
─ Questão de opinião, só isso!
─ E qual sua opinião?
─ Depende. Sobre o quê?
─ Sobre... sobre o que a gente estava discutindo?
─ Deixa eu pensar... ih, não lembro.
─ Nem eu. Tá, esquece. Vamos começar tudo de novo.
─ Tá bem, Gerson.
─ Não. A gente ainda não se conhece, então você ainda não sabe meu nome.
─ Ah, tá bem.
─ Tô chegando. Você não me conhece. Oi, sou o Gerson.
─ Oi, sou a Andréa.
─ Oi, Andréia... qual seu signo?
─ Êpa... você tinha que me perguntar o que eu queria beber!
─ Por que? Quando?
─ Ah, entendi, desculpe. Nada aconteceu, é tudo novo, ok.  Meu signo? Sou Gêmeos.
─ Típico.
─ O que quer dizer?
─ Por isso você nunca tem opinião, fica sempre entre uma e outra...
─ Ei, a gente não combinou de “começar tudo de novo...”?
─ E começamos!
─ Então, por que você está usando coisas do tempo que a gente ainda nem se conhecia?
─ Se a gente não se conhecia, como poderia saber disso, saber que eu sei, hein?
─ Ah, não! Não me venha com essa racionalidade!
─ Tá bem, esquece tudo, a gente nunca vai se entender mesmo.
─ Ah,é? E depois disso tudo, como é que vou te esquecer?
─ Hein?
─ Vai ser impossível, né?
─ Viva! Finalmente você disse algo afirmativo, objetivo, direto!
─ Meu bem, eu já tinha dito algo...
─ Não fala nada! Vamos sair daqui, vamos pra onde só exista a gente, onde possamos ficar sozinhos, pelados, felizes e livres!
─ Mmmmm... Legal!
─ Gostou, né?
─ Tô pensando.

sábado, 9 de março de 2019

Narração profissional


Chegando o carnaval, lembrei do incidente cômico de uma viagem que fizemos, aproveitando os feriados. Dois casais, cinquenta minutos até o aeroporto de Florianópolis, bagagem para cinco ou seis dias.
    No mesmo voo está o conhecido narrador esportivo Armindo Antônio Ranzolin e a família. Apesar da viagem ser curta e rápida, na chegada a correria é geral. Claro, feriados e Floripa combinam e convidam. A ansiedade aflora.
    Do desembarque até a esteira de bagagens, todos os passageiros naquele passinho apressado de gueixa, quando a gente tá correndo sem querer mostrar que está correndo. A esteira está contornada de gente louca pra aproveitar as praias e os dias de folga.
    Malas, bolsas e mochilas começam a surgir daquela janela que parece a entrada de uma casinha de ratos e vão sendo resgatas aos poucos. Vem minha mala, eu pego. Vem outra mala das nossas, eu pego. Outra, pego. Só falta a bolsa da nossa amiga.
    Lá no início da esteira, por onde as malas chegam, se posiciona o Ranzolin, atento. De repente, com aquela voz de trovão dos locutores de futebol, ele grita de lá:
    - Olha, gente, tá passando um soutien que deve ter caído de uma mala.
    Risadas, algumas gargalhadas e todos na expectativa, atentos à trajetória do soutien solitário, desfilando na esteira. Qual das mulheres da fila pegaria a peça íntima? Mas o soutien faz toda a volta e não é resgatado.
    - Ahhhhh... – Ecoa o lamento de uma turminha de rapazes que já está no clima de carnaval.
    Com certeza, a delicadeza com bagagens,que é  típica dos funcionários de companhias aéreas, rasgou ou arrebentou o fecho da bolsa, espalhando seu conteúdo. O soutien retorna para outro desfile e se renova a expectativa. Todos os olhos o seguem. E então:
    - Agora veio uma calcinha! – Brada o Ranzolin lá do canto.
    Todos se viram naquela direção. Surge um novo elemento.
    - Agora vai! – Diz um daqueles rapazes.
    Mas, outra vez, a frustração:
    - Ahhhhhh.... – Lamentam.
    Ninguém pega as peças. Agora são uma calcinha e um soutien dando voltas e todos rindo. Eis que:
    - Outra calcinha, pessoal! – Anuncia Ranzolin.
    A esposa lhe dá um tapinha nas costas, repreendendo-o por estar chamando a atenção para algo que deixa qualquer mulher constrangida. Ele se justifica, só queria ajudar!
    Então começam a surgir várias peças íntimas, espalhando-se esteira afora e, cada uma delas, sendo narrada por Ranzolin como se estivesse anunciando a escalação de um Grenal.
    Nossa amiga dá um beliscão no marido que estava se divertindo com a situação e lhe diz entredentes:
    - Pelo amor de Deus, faz aquele homem calar a boca!
    - Ué, por que? – Pergunta ele ainda esfregando o braço ardido do beliscão.
    - Porque essas calcinhas são minhas! – Diz ela, raivosa.
    Mas ela própria percebe que não há como fazer “aquele homem calar a boca” e, conformada, constrangida e irada, puxa sua bolsa com força da esteira e começa a catar as calcinhas e soutiens que lentamente circulam.
    Aos poucos as pessoas vão pegando suas malas e deixando a esteira, enquanto a gente espera para ter certeza de que nenhuma outra calcinha apareça.
    Toda vez que penso em futebol, lembro dessa amiga que, mal ou bem, teve suas calcinhas e soutiens narrados por um dos maiores locutores do Brasil. É de se orgulhar!

sexta-feira, 8 de março de 2019

Fantasia


domingo, 24 de fevereiro de 2019

Os mitos

Óscar Fuchs

Depois de morrer, ele chega a um lugar qualquer e encontra outro sujeito.
─ Inferno. ─ Diz ele.
─ Hein? ─ Pergunta o outro.
─ Quero ir para o inferno. Quero ver todos aqueles canalhas queimando, os políticos corruptos, os corruptores de políticos, os que votaram nos políticos corruptos... faço esse sacrifício, só pela satisfação. ─ Ele explica.
─ Ah, não tem nada disso, não. ─ Diz o outro com um leve sorriso.
─ Como assim?
─ Não tem.
─ Então, não existe isso de céu e inferno?
─ Não.
─ Quer dizer que ninguém é punido?
─ Ninguém.
─ Nem pastor picareta, nem miliciano?
─ Não.
─ Juiz de futebol?
─ Também não.
─ Mas, e isso aqui, o que é isso aqui?
─ Aqui? Nada.
─ Como, “nada”? Tô te vendo!
─ Sim, e...?
─ Ah, não me enrola. É pegadinha, né? Essa fumacinha pairando na atmosfera, esse chão branco limpíssimo, tem você!
─ O que tem eu?
─ Confessa, vai. É sacanagem que vocês fazem com os novatos, já saquei. Você tá todo de branco!
─ Tá, e daí?
─ Como “e daí”? Essa é exatamente a imagem que divulgam pra gente: chegando lá em cima, você vai encontrar... isso aqui!
─ “Em cima”, do quê?
─ Ah, você sabe, eu não vou ficar explicando detalhes!
─ Certo. Então podemos ir.
─ Aí é que está! Ir pra onde? Pra que inferno de lugar vocês levam a gente?
─ Já falei que não tem esse negócio de inferno.
─ Tá bom, tá bom! Já entendi! Mas tudo tem uma razão, um motivo, tudo tem um objetivo, tem uma...
─ Qual razão você acha que deveria ter?
─ Vem cá, antes de chegar aqui você foi atendente de telemarketing ou psicólogo, né? Nunca responde uma pergunta?
─ É que as suas perguntas...
─ Eu sei, eu sei, as crenças, as religiões, Kant, Nietzsche, Schopenhauer...
─ Mito.
─ Quê?
─ Tudo mito.
─ Então é Lévi-Strauss?
─ Você apenas existiu, agora é nada, só isso.
─ Então, é o ser lá embaixo, e o nada aqui?
─ “Lá embaixo”...?
─ Você entendeu! É isso?
─ Isso mesmo.
─ Putz, era Sartre? Espera, pra onde a gente tá indo? Mas que atendimento ruim, hein? Tem ouvidoria?

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

Gatos


Estou criando uma coleção de tiras com as filosofadas da Filó. Agora, com a chegada do livro, tive que dar um tempo. Retomarei logo.




Soube que o colega Nando Gross adotou há algum tempo uma gata de estimação. Quando era colunista d’A União, Carlos Romero, colega também colunista, teve problemas com ratos embaixo da casa e, após várias tentativas de combate aos roedores, tomou uma medida radical: adotou um gato. Na ocasião escrevi uma coluna dando dicas a Romero, pois era perceptível sua inexperiência com gatos. Pra começar, ele sequer sabia que, entre os felinos, quem caça é a fêmea. O tal empoderamento feminino já é vigente há milênios entre os bichanos. Claro que gatos machos também perseguem e capturam ratos, mas apenas para brincar, para treinar, ou para fingir que mandam no pedaço.

Naquela época fazia sucesso o filme O Exterminador do Futuro. Mesmo sabendo que o animal não sairia à caça, sugeri que Romero batizasse o gato de Schwarzenegger. O problema é que toda vez que Romero chamava o gato, o animal fugia correndo pensando que estava sendo xingado. Isso sem contar a dificuldade de chamá-lo: tente pronunciar três vezes seguidas o nome Schwarzenegger.

Como eu previra, Schwarzenegger não correspondeu. Capturava um que outro rato, de tempos em tempos, só por diversão. Acabou ficando porque Romero se apegou a ele. Quanto aos ratos embaixo da casa, Romero se mudou.

Agora, para o Nando, um naco de história: Por que há gatos em todo o mundo? Eles ganharam o mundo graças às grandes navegações, durante os séculos XV e XVI. Navios passavam meses ou anos nos mares. Uma das maiores pragas nos navios eram os ratos que, além de consumirem e inutilizarem a comida, transmitiam doenças e atormentavam os marinheiros. O raciocínio foi o mesmo do Romero: em cada porto de partida, gatos eram embarcados. Ao chegarem ao destino, os navios eram esvaziados para limpeza e reparos. Lá se iam os gatos, saltitando por outro porto, muito longe daquele em que viviam. Assim, se espalharam pelo planeta.

Quem convive com gateiros certamente já conheceu alguma gata chamada Bastet, ou Bast, ou outras grafias do nome. Já percebeu como há figuras do Egito Antigo representando gatos? Isso porque eles cultuavam a deusa Bastet, mulher com cabeça de gato. O animal era muito querido por proteger as mulheres contra invasores e quem os ferisse era punido com a morte. Em 525 a.C., na batalha de Pelúsio, no Baixo Egito, o rei persa Cambises II ordenou a seus soldados que usassem gatos como escudo, prevendo que não seriam atacados pelos egípcios por causa de sua veneração a Bastet. E funcionou. Os egípcios de Pelúsio se renderam. Foi algo como “basta um jipe, um cabo e um soldado...”.

Gengis Khan também usou gatos em batalha. Ao tentar transpor a Grande Muralha da China, uma cidadela resistia ao cerco de suas tropas. Depois de várias tentativas de tomada do povoado, Khan enviou emissários impondo condições: ele levantaria o sítio se lhe entregassem, entre outras coisas, mil gatos. As “outras coisas” eram apenas despistes. Quando os aldeões lhe deram o que pedia, mandou que seus soldados amarrassem longas cordas com estopas embebidas em óleo no rabo dos gatos. Atearam fogo às estopas e os bichanos apavorados voltaram em correria para a aldeia que se rendeu para não ser totalmente incendiada.

Para terminar, a polêmica do angorá. O angorá legítimo e puro não existe mais. Alguns insistem – sobretudo aqueles criadores que visam a comercialização da “raça” – que os angorás de hoje são os originais, mas não é verdade. “Angorá” vem de “Ankara”, cidade da Turquia que é a origem desse gato. De lá foi levado como souvenir para a Europa. Em vias de extinção, os turcos pesquisaram e fizeram uma mistura com outros gatos, que deu origem a esse que é chamado de “Angorá” por alguns, por “persa” por outros e é classificado como “pelo longo” por algumas entidades. Então, quando alguém disser a você que tem um gato angorá, ou que viu um gato angorá, é outra fake news.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

O que tem por baixo


Resurge a era da Terra plana. Pelo que entendi, flutua feito um prato ao redor do sol, se é que ainda não aboliram o movimento de translação. Só que o planeta não seria exatamente plano. É, digamos, como um pão árabe, com altos e baixos, planícies e montanhas, montes, morros e vales.

A grande questão que vem desde a idade das trevas é, o que existe lá no fim? Além da borda? Segundo alguns, um abismo ornamentado por uma linda cachoeira, maior que Cataratas do Iguaçu, que não se desfaz em nada, por que não há rochas lá embaixo. Aquela água toda fica flutuando pelo espaço. Na maior parte é água salgada, o que imagino que faça um mal astronômico ao Universo e talvez estejamos cercados por todos os lados de ferrugem.

Pensei nisso tudo e também num colega de redação que tive. Toda vez que via uma mulher exuberante, ficava pensativo por instantes e murmurava em seguida:

-­ É linda, perfeita, sensual, insinuante, elegante, num vestido sexy...o que tem por baixo?

Sobre a Terra plana, a mesma dúvida me ataca ­- tento me defender, mas ela me acerta um direto no raciocínio:

-­ O que tem por baixo?

Logo, outras dúvidas chegam em apoio àquela e também me atacam. Agora com paus e pedras:

-­ Ali por baixo, teria mais terra? E as raízes, ficariam penduradas assim, como aquelas plantas que flutuam na água? E as pedras, caem?

Fico lá me contorcendo e gemendo depois de sofrer com dúvidas tão contundentes. Não são bons tempos para se fazer perguntas pertinentes.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

domingo, 6 de janeiro de 2019

Fashionite

Óscar Fuchs


Doença inflamatória e contagiosa que ataca o senso do ridículo. Pode ser aguda ou crônica.

Aguda: ataca em intervalos. O paciente passa a sentir a necessidade irrefreável de usar determinado tipo de vestimenta, acessório, corte de cabelo, etc. Após um período de convalescença, retoma a consciência crítica, acarretando a recuperação.

Crônica: também chamada de não tem mais jeito. O paciente vive em estado de doença, adotando toda e qualquer tendência que percebe na televisão e na internet. Nesse estágio, a doença já afetou o cérebro e não permite distinguir excessos (cores, comprimentos, exageros), levando o paciente a padecer de olha só aquilo!, de tem cada tipo! e de que figura!, males relacionados à falta de percepção da vítima de fashionite crônica.

A fashionite apareceu no século XIX, quando mulheres começaram a usar armações incômodas e exageradas sob as saias. A mania se estendeu para várias partes do mundo, dando início ao “modismo”. Com o avanço dos meios de comunicação, “modismo” se globalizou e recebeu influência de outras culturas, foi propagado e virou “fashion”, donde vem a fashionite.

A fashionite começou a ser transmitida por revistas, depois pelo rádio, pelo cinema, mais tarde pela televisão e hoje se propaga com virulência pela internet, por redes sociais, canais de youtube e programas de TV que divulgam notícias e fofocas de sub-celebridades, jogadores de futebol e pseudo-famosos, os principais vetores de transmissão da doença às massas.

Sintomas: Percebe-se a instalação da doença quando surgem alterações nos pelos do corpo (corte de cabelos ridículo, barba exagerada, pelos pubianos e sobrancelhas delineadas), na fisiologia (face distorcida, glúteos trabalhados no silicone, bíceps, tríceps e seios incompatíveis), alterações na fala e na inteligência, repercutindo na forma de vestir e se comportar.

Hospitais, clínicas e laboratórios farmacêuticos não estão preparados para lidarem com a doença. Quando se fala da fashionite, a tendência -­ palavra muito apropriada -­ é tornar-se uma pandemia. No entanto, não se tem ainda uma projeção de até que ponto a doença pode afetar as pessoas no futuro. Atualmente, rebolada até o chão gravada e transmitida para o grupo do watsap foi considerado o estágio mais avançado da doença.