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terça-feira, 24 de agosto de 2010

ONOFRE, o novato no campo

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Depoimento

(Óscar Fuchs)

O policial me pegou pelo braço e foi me levando. Conduziu-me até a mesa do delegado e me empurrou para que sentasse na cadeira defronte à escrivaninha. Esperei que o policial saísse, cruzei os braços sobre a mesa do delegado e comecei a falar.

— Muito bem, senhor delegado. Não importa o que lhe disseram ou deixaram de dizer, o que aconteceu foi o seguinte: eu não vinha em alta velocidade, apenas oitenta quilômetros por hora. Eu sei, eu sei que estava no centro da cidade, mas isso não vem ao caso. Como ia dizendo, eu vinha vagarosamente e cheguei ao ponto em que aquele imbecil do fiscal de trânsito me parou. Cruzamento? Que cruzamento? Não vi cruzamento nenhum, não senhor. Placa avisando? Semáforo? Por favor, então o senhor acha que eu não veria uma placa? Um semáforo? E o que é pior, está insinuando que não vi nem o cruzamento? Não havia nada disso! O que? O agente de trânsito disse isso? Ele falou isso? E só porque aquele imbecil passou seis horas fazendo plantão numa esquina que não existe o senhor prefere acreditar nele a acreditar em mim?

Respirei fundo, inconformado com a injustiça e continuei:

— A verdade é que se havia semáforo, devia estar escondido nos ramos daquela árvore no canteiro central. O que? Aquilo não é árvore? Claro que é, doutor. O senhor acha que não conheço uma árvore quando vejo uma? Pensa que fui criado onde, no deserto do Sahara? Na frente da minha casa mesmo tinha uma e eu vivia trepando nela. Anos depois minha mãe contratou uma empregada e eu parei de trepar na árvore. Conheço uma árvore de longe, já bati numas vinte, pelo menos. Como? O senhor quer dizer que aquilo não era um tronco de árvore, mas o poste do semáforo que não vi? Ah, mas isso aqui ta parecendo brincadeira. Pede um cafezinho pra mim, doutor.

Tomei fôlego para continuar:

— Onde eu estava? Ah, sim. Então o agente de trânsito mandou que eu parasse e... Hein? Desacato a autoridade? Aquele idiota, filho de uma mula disse que o desacatei? Só porque mandei ele enfiar a caneta... Murro na cara? Eu dei um murro na cara dele? Não, doutor, isso não. Nunca. Jamais. Posso até ter dado um chute entre as pernas daquele safado, mas só isso. Até porque ele queria me multar porque eu vinha a oitenta por hora, porque passei o sinal fechado, porque atropelei uma velhinha. Ah, não foi uma? Foram quatro? Vai ver era saída da missa! Para finalizar, doutor, não cometi nenhuma infração de trânsito.

Terminei minha argumentação e recostei-me calmamente na cadeira. Porém, o delegado entrou na sala, sentou-se na poltrona que estava vazia ali na minha frente e me lançou um olhar tão ameaçador que confessei tudo.