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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Loucura!

(Óscar Fuchs)


Como já revelei (ler Os gsepgmolj e Até os gsepgmolj!), tenho contato com ETs. Os gsepgmolj vieram à Terra fugidos da grande catástrofe que assolou seu planeta: uma invasão de Carlinhos Browns. Assumiram a aparência humana e um deles até optou por ter corpo de homem, mas com seios e bumbum arrebitado. É o primeiro travesti interplanetário do mundo. Viviam em algum lugar na galáxia a²+b². Não resisti à piada e chutei o nome do planeta:
— Hipotenusa? Há! Há! Há!
— Não, Vrlizov. — Disseram-me, sisudos.
Costumamos nos encontrar no Boteco do Vandi, aqui embaixo, no meu prédio. Estão sempre ali bebendo aquela vodka vagabunda do Vandi porque relacionaram o nome dela a seu planeta. Já há três deles no AA.
Evito ir ao boteco porque sempre vem um gsepgmolj me importunar com perguntas que não sei responder: Por que vocês se matam uns aos outros? Vocês veneram o dinheiro porque é ele o seu deus? A Daniele Winits ta solteira?
Passei a ir disfarçado ao Boteco do Vandi, mas não deu certo porque eles parecem ter uma visão de raio X. Deduzi isso dia desses, quando apontaram para minha braguilha e começaram a rir descontrolados.
Nos últimos dias de 2012 fui ao Boteco do Vandi e os gsepgmolj estavam lá. Como sou o único que sabe que são extraterrestres, correram a mim para esclarecer algumas coisas:
— Terráqueo! Terráqueo! Ajude-nos, por favor... e tire essa barba postiça ridícula.
O novo disfarce não deu certo e tirei a barba:
— Ta bem, no que posso ajudar?
Um deles colocou o braço sobre meus ombros para falar ao meu ouvido. O outro fez o mesmo para se apoiar porque estava caindo de bêbado.
— Que bagunça é essa no seu planeta? – Cochichou o da direita.
Arrrôut! — Arrotou o outro na minha orelha esquerda.
Percebendo o mal-estar, o da direita mandou que o outro sentasse. Ele nos abraçou comovido, chorando:
Nós se amemos... ihc! ... nós semos amigos!
Depois me deu um beijo e sentou-se.
— De que bagunça você está falando? — Perguntei ao primeiro.
— Essa correria, essa loucura, todos indo às lojas, comprando freneticamente... por que isso?
— Ah, isso? Não é loucura, é o natal! — Respondi.
— Natal? E o que é natal?
Tentei sintetizar:
— Estamos comemorando porque Deus teve piedade de nós e...
— Ah, a piedade do dinheiro, é isso que comemoram?
— O dinheiro não é nosso Deus.
Suspirei e tentei continuar
— Comemoramos a vinda do filho de Deus...
— O cartão de crédito?
— Hein?
— Se é filho do seu deus dinheiro, deve ser o cartão de crédito. Vocês comemoram a vinda do...
— Eu já disse que o dinheiro não é nosso Deus!
Gastei o resto da tarde explicando a ele tudo o que podia sobre o natal. Não ficou muito satisfeito porque, segundo ele, ainda restaram algumas lacunas. Por exemplo: como é que poderia haver uma araucária lá em Belém, num quase deserto do Oriente Médio? E o pior, como é que Papai Noel entrega todos os presentes na mesma noite, se enquanto é noite aqui não é noite lá no outro lado do planeta? Concordou que isso ficasse para depois, o que mais o intrigava era a correria:
— Então, depois acaba a loucura? — Perguntou.
— Bem, agora vem a festa de réveillon. — Respondi — Mas isso eu explico outro dia.
— Ta certo, mas... depois desse de ré vem um, a loucura acaba?
— Depois? Depois... deixa eu ver... carnaval. Antes disso nós todos vamos pra praia, passamos um ou dois meses à beira mar, aquilo lá fica uma loucura e...
— Outra loucura?
Dei um sorriso constrangido:
— Não é tanto assim. Mas só depois da praia vem o carnaval e, aí sim, são quase sete dias de festa, isso vira uma doideira.
— Doideira... loucura... Terráqueo, quando é que vocês voltam a ser... digamos... normais?
— Ah, só depois de março. Depois virá a páscoa, quando celebramos a ressureição, então todos ganharemos ovos de chocolate. O coelhinho vem e coloca os ovos numa cestinha.
Ele refletiu e perguntou:
— Numa cestinha?
— Sim.
— Coelhinho?
— Isso.
— Colocando ovos?
— Exato.
— Vocês acreditam num coelhinho colocando ovos numa cestinha?
— Deixa pra lá.
Ele pensou um pouco e voltou com as perguntas:
— E de quem é a ressureição?
— Do filho de Deus. — Respondi.
— Ah, o cartão de crédito?
Saí sem responder.