(Óscar Fuchs)
Na Grécia Antiga a
justiça era na praça, na ágora. Dois
vizinhos que se acusavam por causa da troca de um porco por oito galinhas que
algum deles não entendeu bem, levavam seus argumentos ao júri, que decidia quem
estava com a razão. Porém, nem todos tinham talento para a oratória, ou poder
de convencimento. Então, contratavam alguém para argumentar em seu lugar, pela
sua causa. Isso logo virou uma especialização e uma profissão, a dos
argumentistas.
Logo, dados os ganhos e
o prestígio que auferia um argumentista, muitos queriam exercer a função. E
surgiram então “professores de argumentação”. Um dos mais bem sucedidos
argumentistas dessa época era Protágoras, admirado por todos e que cobrava caro
por seus serviços. Protágoras tornou-se também o mais requerido mestre de
argumentação.
Vendo a atuação de
Protágoras num daqueles júris, estava na plateia certo dia um jovem chamado
Euatlo. Ele ficou encantado com a perspicácia e a inteligência de Protágoras e
decidiu tornar-se um argumentista. Mas para isso precisaria de aulas e ele
queria ser aluno do melhor: Protágoras, o mais caro mestre. Tanto Euatlo pediu
a Protágoras que o aceitasse, que o mestre concordou em lhe dar aulas. Fizeram
um acordo: assim que Euatlo vencesse sua primeira causa, pagaria a Protágoras as
aulas recebidas.
Terminadas as aulas,
Euatlo foi em busca de trabalho, de uma causa a defender. Jovens iniciantes e
inexperientes, no entanto, tinham dificuldade em convencer novos clientes.
Assim, se passaram meses sem que Euatlo conseguisse uma causa com a qual
pudesse provar sua capacidade e pagar Protágoras. O que fez então, Protágoras?
Levou sua causa a júri: queria receber o dinheiro devido por Euatlo.
Nas discussões que
precediam as argumentações, percebia-se no povo que lotava a ágora a expectativa pelo embate: o
promissor aluno, contra o melhor dos mestres. Quem venceria?
Não houve justiça. Ninguém
venceu. Não houve conclusão. Não se chegou a um juízo. Tudo porque o grande
mestre argumentava — com razão — que o acordo firmado obrigava que Euatlo
pagasse Protágoras assim que vencesse sua primeira causa: em ganhando, Euatlo
teria de lhe pagar, pois o jovem vencera sua primeira causa; em perdendo,
Euatlo também teria de lhe pagar porque assim havia decidido o júri.
Mas, tão bom foi o
mestre e tão promissor o aluno que o argumento de Euatlo anulou o de seu
oponente. Dizia Euatlo — com razão — que o acordo firmado o obrigava pagar
Protágoras assim que vencesse sua primeira causa, logo, se Protágoras ganhasse,
nada teria que receber pois Euatlo não vencera e, se Protágoras perdesse, também
nada teria que receber pois assim decidira o júri.
E o que Moro tem a ver
com isso, além do fato de também ser do Direito? Há algum tempo chamei-o de
incompetente porque não tinha coragem de inocentar Lula pelos compromissos
assumidos com a direita, mas também não conseguia condenar Lula apesar de tanto
furungar e tentar “arranjar” provas. Ele mesmo já sabia disso e agora, de uma
vez por todas, resolveu tirar o corpo fora. Fez mais ou menos o que faz aquele
árbitro de futebol ao terminar a partida com placar em 1 a 1, sem dar
acréscimos: contenta todo mundo e se safa de acusações. A direita não poderá
acusá-lo de descompromisso, nem a esquerda poderá dizer que ele é um banana, um
pau-mandado. Ele acusou Lula! Mesmo sabendo que não vai dar em nada. Jogou pra
torcida.
Não houve justiça, como no caso de Euatlo e
Protágoras...embora por razões muito diferentes.