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segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

À Guisa de

(Óscar Fuchs)

Sentei ao computador e lembrei dos bons tempos em que nós, jornalistas, usávamos máquina de escrever. À guisa de informação aos mais novos, máquina de escrever não era uma caneta, mas um aparelho com hastes internas e, na ponta de cada haste, uma letra em maiúscula e minúscula. A haste batia no papel que estava preso a um rolo e imprimia letra por letra. A máquina de escrever tinha um formato levemente quadrado.
"Quadrado" era uma gíria que nós, jovens de antanho, usávamos para ofender e insultar os mais velhos: "Pô, você é um quadrado!". Na verdade, se referia a uma pessoa correta, certinha, "quadradinha", conservadora, mas passou a designar pessoa idosa que usava expressões como "à guisa de", “antanho” e “cousa”.
A propósito, “antanho” é a forma antiquada de “então”.
Pois bem. Nos bons tempos de antanho em que ainda se usava máquina de escrever, "à guisa de" e outras cousas, se usava também talento. "Talento" é uma palavra que denota qualidade. Talento era uma necessidade, um requisito imprescindível para quem quisesse ser jornalista. Era obrigatório saber escrever, escrever bem. Como dizia Fernando Sabino, só se aprende a escrever quando se sabe ler. Ou seja: só a boa leitura leva ao bem escrever.
Fernando Sabino era um escritor, um cronista, um articulista. "Articulista" era uma pessoa que tinha talento e uma máquina de escrever. Ele escrevia artigos. "Artigo" era um texto em que se expunham idéias, se tentava provar alguma cousa ou se contava uma história. Era uma delícia ler os articulistas todos os dias nos jornais. Hoje não existem mais, sumiram. Talvez porque os articulistas escreviam para pessoas cultas que gostavam de ler. O jornal de hoje não é feito para pessoas cultas e que gostam de ler, então defenestraram o talento e os articulistas, os cronistas, os colunistas.
"Defenestrar" é uma palavra que vem do latim, “fenestra”, “janela", "fresta”. Portanto, "defenestrar" é "jogar pela janela" alguma cousa, um objeto, um produto, um artigo qualquer. Esse "artigo" não é o mesmo "artigo" que o Fernando Sabino escrevia.
Talvez seja certo pensar, então, que os articulistas, assim como seu talento, o "à guisa de" e a máquina de escrever se tornaram obsoletos, considerados uns "quadradões" e foram defenestrados, como cousa qualquer, dos periódicos. "Periódico" é como era chamado o jornal antigamente, porque ele saía periodicamente.
Há, no entanto, quem pense que os próprios articulistas, cronistas, escritores e colunistas se auto-exilaram no momento em que o território das ideologias foi queimado e coberto de sal, tal e qual romanos fizeram com Cartago. "Ideologia" era uma coisa que existia antes do dinheiro ser mais importante. As pessoas tinham pontos de vista e defendiam esses pontos de vista ou, pelo menos, se questionavam sobre eles.
De qualquer jeito, hoje é muito difícil ter o que ler num jornal. Há sobreviventes, mas não tantos quantos quando se usava o “à guisa de”. Imprime-se muita "figurinha", muita fofoca de artista, muito gráfico. Poucos artigos interessantes e muito "textículo". “Textículo" é como chamávamos os pequenos textos, de fácil leitura, fácil compreensão, não o que você está pensando. Você está pensando? Ótimo. Pelo menos alguém ainda faz isso!

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